sexta-feira, 16 de agosto de 2013

As três mosqueteiras

Sofia correu até o telefone quando soou o toque característico da chegada de mensagens em seu celular. Aguardava ansiosa pela confirmação da chegada da filha mais velha, Giovanna. Ela tinha 28 anos quando ganhou seu primeiro bebê; 2 anos depois Luiza chegou.

Formado há 24 anos, o trio ficou conhecido nos ambientes por onde passou por ser sorridente e um tanto diferentes entre si. A mãe gostava de chamá-las de "As três mosqueteiras".

Naquela tarde de sábado, diante da confirmação da presença de Giovanna, Sofia e a caçula se prepararam para a visita, que prometia momentos de intimidade. Anna - como era chamada pela família - passou 21, dos seus 26 anos, dividindo o quarto (e tudo mais) com Luiza. Brigavam como mulheres e se amavam como irmãs; apesar de todas as diferenças óbvias e as mais discretas, eram muito próximas, uma relação pouco compreendida por aqueles com quem conviviam.

Há seis meses a irmã mais velha mudou-se para São Paulo e aquela seria a primeira vez que a veriam trajando o seu tão sonhado uniforme.

À noite, Sofia e Luiza estavam prontas duas horas antes do horário previsto para o pouso. Preparadas para esperar, estacionaram em frente ao desembarque e ali ficaram, ouvindo música e discutindo as dificuldades enfrentadas por Lu na faculdade de Engenharia.

Sofia sentiu, então, uma forte dor de barriga. Era uma sensação estranha, como se uma bola se formasse em seu estômago; estava enjoada e lhe faltava o ar. Enquanto bebia água, na tentativa de sentir-se melhor, pensava sobre aquela dor e recordava-se das poucas vezes em que a havia experimentado.
Lembrou de uma ligação, seis anos atrás, em que Giovanna chorava ao telefone, contando à mãe que ela e a irmã haviam sofrido um acidente e aguardavam a presença da ambulância.

***

Do outro lado da mensagem, Anna fechava a mala rumo à casa de sua mãe. Tinha planos para o jantar e já havia selecionado o filme da noite. Aquele foi um dos seus voos mais contentes, felizmente para os passageiros, que foram recebidos com cordialidade acima do comum, sorriso no rosto e ansiedade no coração.

Cabine pronta para o pouso. Agora faltavam poucos minutos.

Apesar de ainda muito inexperiente, não foi necessário muito para que Giovanna cruzasse seu olhar com a colega sentada ao lado. Em silêncio, as duas confidenciavam que algo estava fora do comum no pouso. 

Apesar de intensamente treinada para agir em uma emergência, quem estava ali era Anna e não a comissária Giovanna. Nos minúsculos segundos em que o avião corria a pista sem nenhum sinal de redução de velocidade, Anna não pensava nas ações imediatas que deveria tomar.

"Logo hoje, em frente a minha mãe." Anna pensava na mãe e na irmã que provavelmente estavam assistindo ao pouso, pensava no recebimento da notícia que chegaria da forma mais dramática, sem filtro algum; ali, na hora.
Naquele momento, não era a sua vida que importava, era a sua morte diante das pessoas que mais a amavam.

***

Na porta do desembarque Sofia, Anna e Lu se abraçaram. Elas ainda não sabiam o que acontecera minutos antes. E aquele não era o momento para falar.

Em casa, com a mala desfeita e o antigo pijama no corpo, ela contou sobre o pouso atípico e sobre suas preocupações, mas antes mesmo que terminasse de explicar os detalhes a mãe disse: eu já sei, senti com você.

Horas mais tarde, enquanto comiam a sobremesa, Anna olhou para mãe e a irmã, e entendeu - ali, naquela hora - que esta poderia ser a última noite. Qualquer noite (todas as noites) poderiam ser a última.

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